11 de julho de 2007

Transição



O amanhecer e o anoitecer
parecem deixar-me intacta
Mas os meus olhos estão vendo o que há de mim,
De mesma e exata.
Uma tristeza e uma alegria
O meu pensamento entrelaça,
Na que estou sendo a cada instante,
Outra imagem se despedaça.
Este mistério me pertence
Que ninguém de fora repara
Nos turvos rostos sucedidos,
No tanque da memória clara.
Ninguém distingue a leve sombra
Que o autêntico desenho mata.
E para os outros vou ficando,
A mesma. Continuada e exata.
Chorai óh, olhos de mil figuras!
Pelas mil figuras passadas
E pelas mil que vão chegando
Noite e dia.
Não consentidas, mas recebidas e esperadas.
(Cecília Meireles)